SE O TEMPO FOSSE OURO..., TALVEZ PUDESSES PERDÊ-LO. - MAS O TEMPO É VIDA, E TU NÃO SABES QUANTA TE RESTA.

terça-feira, 20 de janeiro de 2009

SEGUNDO ANO – AULA 1 - ALMA


ALMA

A. O princípio da vida, do pensamento e dos dois ao mesmo tempo enquanto considerado como uma realidade distinta do corpo através do qual manifesta a sua atividade. Esta realidade pode ser, aliás, concebida, quer como material: Epicuro, em Diog. Laerc. X, 33: "Dei flatu natam, immortalem, corporalem, effigiatam"; Tertuliano, De Anima, 8, etc.; cf. mais adiante, Renouvier, observações; quer como imaterial: "A alma é de uma natureza que não tem nenhuma relação com a extensão nem com as dimensões ou outras propriedades da matéria de que o corpo é composto." Descartes, Paixões da alma, I, art. 30, etc.
Sobre o sentido amplo e o sentido estreito da palavra alma (1º qualquer mônada; 2º só as mônadas que têm percepções distintas e acompanhadas de memória), ver Leibniz, Monadologia, § 19.
B. Princípio de inspiração moral. "Ter alma", expressão de Ancillon, louvada por Mme de Staël, que acrescenta: "É este sopro divino que faz todo o homem: amando-se aprende-se mais sobre os mistérios da alma do que através da metafísica mais sutil." De l’Allemagne, 3a parte, cap. II.

Critica

Esta palavra implica sempre uma dualidade de natureza e de fins, uma oposição, pelo menos provisória, com a idéia do corpo quer do ponto de vista metafísico, quer do ponto de vista empírico, quer do ponto de vista moral, "quer mesmo do ponto de vista estético, por exemplo, quando se diz que é preciso ter alma para ter gosto". (Carta de Maurice Blondel) Distingue-se da palavra espírito*: lº por conter a idéia de uma substância individual; 2º por ser mais compreensiva, aplicando-se sobretudo a palavra espírito às operações intelectuais. Opõe-se igualmente ao eu na questão de saber se a nossa alma "é maior que o nosso eu", quer dizer, se a nossa existência psíquica é mais rica de conteúdo do que aquilo de que temos consciência.
Existe mesmo, no mais das vezes, entre os modernos, um sentido religioso em conseqüência de uma associação muito geral: lº entre a idéia de alma e a idéia de imortalidade; 2º entre a idéia de alma e a idéia de Deus, considerado como a origem e o vínculo das almas segundo o Cristianismo (Descartes, Malebranche, Leibniz, Berkeley, etc.).
Rad. int.: Anim.

Alma vegetativa - A alma ou a parte da alma que produz a nutrição, o crescimento, a reprodução e o declínio dos seres vivos mesmo não dotados de sensação e de sensibilidade.

Alma Sensitiva – A alma ou parte da alma que é o principio de sensação e da sensibilidade, mesmo nos seres que não possuem razão.

Alma Racional - Anima sensibilis ou Spiritus vitalis, Bacon. É a alma capaz de abstrair, raciocinar e criar.

SEGUNDO ANO – AULA 2 - JUIZO


O JUÍZO

1. Noção. — O pensamento pode ser estudado, não só sob ponto de vista psicológico, como sob o ponto de vista lógico. No primeiro caso, ele é considerado como uma atividade psíquica e, no segundo, como o resultado dessa atividade, o qual pode ser abstraído da consciência que o produz. Assim, “enquanto a Psicologia se ocupa da atividade real do pensamento, a Lógica atende unicamente ao produto dessa atividade, isto é, ao pensamento tomado em si mesmo".
As três operações específicas do trabalho intelectual do homem são o conceito, o juízo e o raciocínio. Estas operações na realidade constituem três momentos de uma única operação que é o pensamento. A formação dos conceitos, como vimos, resulta da elaboração dos elementos fornecidos pelas percepções e imagens concretas e individuais. Todavia, pesquisas recentes têm demonstrado a possibilidade do pensamento sem imagens. Certos conceitos superiores, como a justiça, a bondade, a força, o tempo, o infinito, não possuem imagens correspondentes. Isto significa que a idéia tende a se desprender do elemento intuitivo e a se tornar cada vez mais abstraia e independente das imagens.

2. Natureza do juízo. — Além de conceber as idéias, a inteligência também se ocupa em determinar suas relações. E o que se chama julgar. Juízo é, assim, o ato pelo qual o espírito estabelece uma relação entre duas idéias ou entre uma percepção e uma idéia: "o homem é mortal" ou "este homem é alto". Pode ser também definido como a afirmação da conveniência ou da desconveniência entre duas idéias: "o homem é um animal racional" ou "homem não é vegetal".
A expressão verbal do juízo chama-se oração ou proposição. Em todo juízo, podemos distinguir uma matéria e uma forma. A matéria são os objetos (idéias ou coisas) e que se aplica o juízo; é representada pelo atributo ou predicado que se afirma e pelo sujeito de quem se afirma. A forma é o próprio ato do espírito que percebe a relação entre o sujeito e o predicado; exprime-se, nos exemplos citados pelo verbo é.
É necessário não confundir o juízo com a associação de idéias. A associação psíquica, quando existe no ato de julgai fornece os elementos; o juízo consiste no reparo e na afirmação da conveniência dessa associação. "Ele é como que um sentimento intelectual: na associação somos passivos, no juízo sentimo-nos ativos".
3. Condições do juízo. — O juízo é o ato essencial da inteligência e supõe a abstração e a generalização, de vez que se baseia numa noção comum para estabelecer relações entre as idéias. Todo juízo, quando completo, termina por uma afirmação, implicando, por conseguinte, a crença em alguma coisa. O juízo não é, porém, uma operação especial da inteligência. Representa, ao contrário, a própria inteligência em ação. Todos os atos intelectuais, desde os mais simples aos mais complexos, nada mais constituem do que cadeias de juízos. Toda a nossa atividade intelectual se processa, assim através de juízos, pois qualquer ato que pratiquemos ou qualquer pensamento que formulemos, envolvem sempre uma crença no seu valor e uma afirmação de sua conveniência, em face da situação em que nos encontramos.
As crenças em que se fundamentam nossos juízos provêm várias causas. Entre elas, podemos assinalar os nossos estados afetivos, fazendo-nos crer em tudo que corresponda aos nossos desejos, propósitos e preferências. Muitas de nossas crenças se formam também sob a influência do meio social em que vivemos, o que faz com que essas crenças tomem o aspecto de verdadeiros "hábitos intelectuais". Daí o fato da repetição uma afirmação acarretar a crença na veracidade dessa afirmação. Assim se explicam o poder de certas fórmulas concisas,o êxito de certas campanhas da imprensa e a eficácia da propaganda. E eis a razão pela qual o mentiroso, muitas vezes acaba por acreditar nas próprias mentiras. . .
Outra fonte inesgotável de crenças é a ignorância, pois temos uma tendência irreprimível para acreditar em todas as asserções que não podemos criticar por falta de idéias opostas. Daí a credulidade ilimitada dos indivíduos incultos, das crianças e dos povos primitivos. Um dos fatores fundamentais da crença é a vontade. Esta, quando débil e vacilante, traz como conseqüência, a disposição do espírito para crer, sem oposição ou critica, nas afirmações que lhe são impostas. Quando, porém, forte e equilibrada, a vontade predispõe ao espírito crítico que só permite a crença depois de uma análise cuidadosa das afirmações que se lhe oferecem.

II. O RACIOCÍNIO

4. Natureza do raciocínio. — Nem sempre o espírito pode apreender, imediatamente, a relação existente entre as idéias. Utiliza-se então das relações entre as idéias que quer unir e uma terceira capaz de lhe fornecer a relação desejada. Sempre que isso acontece, diz-se que o espírito raciocina. Raciocínio é, assim a operação pela qual estabelecemos uma relação entre dois ou mais juízos. Todo raciocínio é, pois, constituído, pelo menos, de dois juízos: um que exprime a relação conhecida e, outro, a relação procurada. Por conseguinte, pelo raciocínio, o espírito conclui do que sabe o que ignora ou vai do conhecido ao desconhecido. O mais simples dos raciocínios é o silogismo que se compõe de três juízos dispostos de maneira tal que, admitidos os dois primeiros, o terceiro se impõe como verdadeiro: "todos os seres vivos morrem: as plantas são seres vivos; logo, as plantas morrem". Os dois primeiros juízos do silogismo chamam-se premissas; o terceiro, conclusão.
Certos psicólogos pretendem identificar o raciocínio com a associação de idéias, mas as diferenças são profundas e evidentes. A associação não se confunde com o raciocínio porque não estabelece a ligação lógica que une as três proposições de que o mesmo se compõe. Além disso, na associação, tudo é automático e se realiza sempre da mesma maneira, ao passo que no raciocínio, a inteligência é ativa e, em idênticas circunstâncias, diferentes soluções podem intervir.

5. Condições do raciocínio. — O espírito raciocina para saber o que ignora, para demonstrar o que já sabe ou para conhecer uma verdade adquirida, mas imperfeitamente compreendida. Do mesmo modo que os juízos, os raciocínios se fundamentam em certos princípios gerais, resultantes, não só de disposições inatas do espírito, como também de sua experiência sobre os dados da realidade exterior. Esses princípios denominaram-se princípios racionais ou dirigentes do conhecimento. Os raciocínios, nada mais sendo do que séries de juízos, sofrem, como estes, a influência dos estados afetivos, do meio social, da educação e da vontade.
Conforme o caminho seguido pelo espírito para ir do conhecido ao desconhecido, o raciocínio pode ser indutivo, dedutivo e analógico. No raciocínio indutivo, o espírito parte do particular para o geral, dos fatos para as leis, das conseqüências para os princípios. No raciocínio dedutivo, o espírito segue para o caminho inverso e vai do geral ao particular, das leis aos fatos, dos princípios às conseqüências. No raciocínio
analógico, o espírito vai do particular ao particular que apresente alguma semelhança com o primeiro. Os psicólogos contemporâneos assinalam ainda o raciocínio transdutivo próprio criança até certa idade. Segundo Stern e Piaget, as crianças costumam raciocinar por esquemas sincréticos, isto é, por meio de agrupamentos de imagens e idéias heterogêneas.

6. Patologia do juízo e do raciocínio. — Duas alterações fundamentais podem ser caracterizadas na patologia do pensamento:
a) Idéia fixa — predomínio absorvente no campo da consciência de uma idéia carregada de forte colorido afetivo.A verificação, pelo paciente, da existência dessa idéia, como reconhecimento da impossibilidade de eliminá-la da consciência, cria um estado de angústia de que podem resultar a idéia obsessiva
b) Delírio — pensamento errôneo "de natureza mórbida de desenvolvimento progressivo que, influindo sobre as convicções e conduta do paciente, não permite que se possa convence-lo do absurdo de suas concepções, conseguindo-se apenas sobre os detalhes secundários dos seus juízos e raciocínio.
7. Função do juízo e do raciocínio. — Fenômeno básico da vida intelectual, o juízo não constitui operação especial da inteligência, mas a própria inteligência em sua atividade cognitiva. Todos os processos intelectuais nada mais representam do que idéias de juízos. "O juízo é o ato essencial da inteligência, só ele dá a posse plena da verdade que é o seu objeto; pois não há verdade no sentido perfeito da palavra, senão quando o espírito afirma a conveniência do que percebe com o que é".
Seqüência de juízos, é imenso também o papel que o raciocínio desempenha na vida psíquica. É através do raciocínio que a inteligência utiliza a experiência adquirida para ampliar, cada vez mais, o âmbito do conhecimento.Todavia, o raciocínio nem sempre representa a razão e há muitos raciocínios que carecem de fundamentos racionais, sem deixar de oferecer uma estrutura lógica irrepreensível. Raciocinar muito não significa raciocinar bem. O raciocínio não possui, por conseguinte, valor em si mesmo. Sua precisão racional e sua importância para a vida do espírito dependem da base de bom-senso, da adaptação à experiência e do sentimento da realidade de que ele se possa revestir.

EXERCÍCIOS

1. Explicar a gênese do pensamento.
2. E possível pensamento sem imagem?
3. Elucidar a natureza do juízo.
4. Caracterizar as condições do juízo.
5. Mostrar a influência que os estados afetivos, o meio social, a educação e a vontade exercem sobre o juízo.
6. Explicar a natureza do raciocínio.
7. Distinguir o juízo e o raciocínio da associação de idéias.
8. Assinalar as condições do raciocínio.
9. Descrever as formas diversas de raciocínio.
10. Assinalar os estados patológicos do juízo e do raciocínio.
11. Pôr em relevo a função do juízo e do raciocínio na vida psíquica.

SEGUNDO ANO – AULA 3 - IMAGINAÇÃO


A IMAGINAÇÃO

I. NOÇÃO DE IMAGINAÇÃO

1. Definição de imaginação. — A imaginação é a faculdade de se representar ou de combinar imagens de objetos ausentes, reais ou possíveis. Pela imaginação, podemos, não só evocar coisas anteriormente percebidas, como também inventar ou criar, em nosso espírito, coisas que, na realidade, não existem. As imagens evocadas se assemelham às sensações que as produziram, havendo, portanto, tantas classes de imagens quantas classes de sensações capazes de as provocar. A imagem, sendo a reprodução da sensação, é mais atenuada do que esta, mas, em certos casos, pode adquirir grande intensidade, como acontece na alucinação.

2. Condições orgânicas e psíquicas. — O exercício perfeito da imaginação, exige, como condição fisiológica, o equilíbrio orgânico e a integridade funcional do sistema nervoso. Os distúrbios fisiológicos refletem-se na atividade imaginativa, deprimindo-a ou exaltando-a. As condições psicológicas da imaginação são as seguintes: a) Condições intelectuais — a imaginação retira seu material dos conhecimentos adquiridos; no reservatório da inteligência ela escolhe certos elementos, dissocia para, em seguida, associá-los em complexos novos. b)Condições afetivas — as disposições afetivas exercem profunda influência sobre a dinâmica imaginativa; o medo, o amor, o sofrimento, a tristeza, a alegria, têm sido as fontes geradoras de todas as grandes criações da imaginação.
A essas condições psicológicas, devemos acrescentar dois fatores de suma importância: a influência da inspiração que representa, muitas vezes, a condição inconsciente da criação imaginativa e a influência do ideal, princípio de unidade, sob a forma de idéia fixa ou de paixão, que vamos encontrar, quase sempre como ponto de partida das grandes construções da imaginação.

II. NATUREZA DA IMAGINAÇÃO

3. Estrutura da imaginação. — Os psicólogos costumam distinguir duas formas fundamentais de imaginação: a imaginação reprodutora e a imaginação criadora. A imaginação se diz reprodutora quando as imagens são reproduzidas ou evocadas, correspondendo, assim, a coisas realmente percebidas. Esta forma de imaginação se confunde com a memória (sem o reconhecimento), sendo, por isso, chamada por alguns autores de memória imaginativa.
A imaginação se diz criadora quando as imagens criadas ou inventadas não correspondem a nenhuma percepção real, tais como: dragões, centauros, fadas, sereias, etc. Objeta-se, entretanto, que a imaginação não cria propriamente imagens, mas apenas dissocia ou associa, modifica ou combina representações antigas. Na realidade, porém em qualquer das formas de imaginação, não existe nunca uma reprodução passiva de dados. A produção da mais simples imagem obedece a uma iniciativa pessoal. Á imaginação é, em todos os casos criadora "porque consegue — com material continuamente utilizado — produções sempre novas e originais".
4. Tipos de imaginação. — Podemos classificar os tipos imaginativos considerando, não só as imagens que predominam na vida psíquica de cada indivíduo, como também o modo de elaboração das imagens e a direção da atividade imaginativa.
Quanto às imagens dominantes, distinguem-se: a) o tipo de imaginação visual — em que predominam as imagens de cores, formas e linhas, como nos pintores e escultores; b) o tipo de imaginação auditiva — em que predominam as imagens de sons, como nos músicos e em certos poetas; c) o tipo de imaginação motriz — em que predominam as imagens motoras, como nos indivíduos cujo pensamento se objetiva, a todo o momento, por palavras, gestos e movimentos.
Quanto ao modo de elaboração das imagens, distinguem-se: a) o tipo de imaginação difluente, em que predomina o devaneio lírio e a fantasia; b) o tipo de imaginação plástica, caracterizado pela nitidez e precisão das imagens.
Quanto à direção da atividade imaginativa, distinguem-se: o tipo de imaginação artística, caracterizado pela riqueza e espontaneidade das imagens; b) o tipo de imaginação científico, em que a fecundidade imaginativa se subordina ao espírito de objetividade e de investigação; c) o tipo de imaginação prática, em que a produção das imagens se orienta para a atividade prática e utilitária.

5. Patologia da imaginação. — As alterações patológicas da imaginação se traduzem por uma exaltação ou depressão mi produção das imagens. A hipertrofia da imaginação se acompanha, às vezes, da mitomania que é a necessidade mórbida de inventar e de mentir. A atividade imaginativa se exalta nos estados histéricos, paranóicos, parafrênicos, toxicomaníacos etc. A imaginação se deprime nos estados de demência, confusão, oligofrênia, etc.

6. Função da imaginação. — A imaginação tem um valor considerável em todas as formas de atividade humana.Sua influencia se faz sentir, imperiosamente, em todas as ações do homem, mesmo naquelas, na aparência, desprovidas de contribuição imaginativa, como o trabalho manual ou as ocupações comerciais e industriais.
Na arte e na literatura, seu valor é imenso, pois é ela que ficção, concebe o ideal, e dá vida, colorido e originalidade à obra artística, a qual, sem o alento da imaginação, seria apenas uma cópia fria e banal da realidade. Na ciência, não é menos valiosa a sua contribuição, pois o trabalho imaginativo é a fonte donde dimanam as hipóteses que conduzem às descobertas.
Na vida individual, a influência da imaginação é benéfica, pois é pela mesma que reagimos contra a rotina, o prosaísmo e a banalidade, impregnando a nossa vida de ideais de trabalho, de cultura e de espiritualidade. Uma imaginação excessiva e transbordante pode, entretanto, ser perniciosa, de vez que exagera as reações afetivas, exaltando as paixões; deforma a inteligência, falseando o juízo e criando idéias utópicas; anula a vontade, deturpando o caráter.
"A imaginação e a inteligência, diz Bossuet, se unem e se auxiliam ou se embaraçam mutuamente. O bom uso da imaginação consiste em tornar o espírito atento, em sustentar e fixar o pensamento. O mau uso consiste em deixá-la decidir".

Exercícios.
Esclarecer a definição de imaginação.
Caracterizar as condições orgânicas e psíquicas da imaginação.
Explicar a estrutura da imaginação.
Assinalar os tipos de imaginação.
Descrever as alterações patológicas da imaginação.
Mostrar a função da imaginação na vida psíquica.

SEGUNDO ANO AULA 4 - MEMÓRIA


A MEMÓRIA

I. NOÇÃO DE MEMÓRIA

1. Definição de memória. — Memória é a capacidade que possui o espírito de fixar, conservar e reproduzir, sob a forma de lembranças, as impressões experimentadas anteriormente. A memória abrange todo o campo da vida psíquica.Todos os fatos psicológicos, qualquer que seja a sua natureza, são susceptíveis de serem revividos pela memória. Em sua significação mais ampla, a memória pode ser considerada como a conservação do passado no presente. "É a colaboração de todo o nosso passado nas tarefas psíquicas que estamos realizando em todos os momentos de nossa vida presente".
Na memória podemos distinguir as seguintes capacidades ou funções: a) capacidade de fixação, pela qual as impressões se fixam em nosso espírito; b) capacidade de conservação, pela qual conservamos as impressões fixadas; c) capacidade de evocação, pela qual as impressões fixadas e conservadas podem ser reproduzidas em nosso espírito; d) capacidade de reconhecimento, pela qual reconhecemos as impressões reproduzidas como fatos da nossa experiência anterior; e) capacidade de localização, pela qual localizamos, no tempo e no espaço, a impressão reproduzida e reconhecida. Alguns autores assinalam ainda outras capacidades, entre as quais, a de expectação que é a antecipação do futuro por meio da memória, isto é, da experiência adquirida.

2. Condições orgânicas e psíquicas. — A fixação e a conservação dos fatos psicológicos estão na dependência das seguintes condições: a) Condições fisiológicas — a memória, sem ser uma função puramente cerebral, depende de certas condições orgânicas. A atividade sinérgica dos órgãos, o equilíbrio endócrino, a integridade funcional do sistema nervoso, fatores que permitem a realização perfeita do fenômeno da memória. As doenças da memória, por alterações anatômicas do cérebro, são provas dessa dependência parcial dos processos mnésicos das condições fisiológicas; b) Condições psicológicas — a aquisição e a conservação dos fatos psíquicos é favorecida: 1) pela repetição das impressões; 2) pela vivacidade e nitidez das impressões; 3) pela atenção; 4) pelo interesse; 5) pela associação lógica dos fatos.
A evocação também se encontra na dependência de certas condições. Sob o ponto de vista fisiológico a evocação depende: 1) da saúde; 2) da idade; 3) da fadiga; 4) de certas circunstâncias físicas (rumor, silêncio, escuridão, etc.).Sob ponto de vista psicológico, a evocação se explica pela associação dos fatos psíquicos. As lembranças não são independentes umas das outras. Associam-se em séries numerosas. A lei teórica da sua revivescência é a chamada lei de reintegração: "cada imagem tende a reproduzir o estado completo que faz parte; cada membro de uma série, a totalidade da série". Geralmente, porém, não se reproduzem todas as imagens da série, mas apenas as que interessam ao espírito no mento considerado. A evocação pode ser espontânea ou voluntária, conforme se verifique ou não a intervenção da vontade.
O reconhecimento é a interpretação da imagem evocada como um fato da nossa vida anterior, do nosso passado pessoal. A imagem reconhecida se acompanha de um sentimento familiaridade (Bergson) e a sua ligação com o nosso eu, apresenta-lhe um "sentimento de personalidade" (Claparède), razão pela qual reconhecer um fato psíquico é reconhecer-se si mesmo. Reminiscência é a lembrança evocada, mas não reconhecida.
A localização é um reconhecimento mais preciso, através do qual localizamos as lembranças no momento da nossa vida em que, as mesmas se originaram. Remontando à experiência anterior e seguindo certos pontos de referência, conseguimos fixar no passado, com maior ou menor precisão, o instante em que se realizaram os fatos de que nos lembramos.

3. Formas de memória. — Podemos distinguir na memória os seguintes caracteres: finalidade, tenacidade, prontidão, fidelidade e extensão. A memória é fácil quando fixa rapidamente as impressões; tenaz, quando conserva por muito tempo as impressões fixadas; pronta, quando evoca com presteza as lembranças; fiel, quando recorda com exatidão; extensa, quando retém grande número de impressões.
Raramente esses caracteres coexistem num mesmo indivíduo. Daí o fato de certas pessoas que aprendem com muita rapidez esquecerem também, rapidamente, o que aprenderam. Outras, ao contrário, conservam por longo tempo o que só conseguiram assimilar com esforço e lentidão.

4. Tipos de memória. — De acordo com o predomínio de certas imagens, os psicólogos costumam distinguir os seguintes tipos de memória:
a) Memória sensível — é a memória das imagens sensíveis, das coisas concretas. Ela se desdobra em diversas memórias: das cores, dos sons, dos sabores, etc. Cada uma dessas memórias pode ainda ser decomposta. Os psicólogos assinalam, porém, três tipos fundamentais de memória sensível: o tipo visual, em que predomina a memória das imagens visuais; o tipo auditivo, em que predomina a memória dos sons; o tipo motor, em que predomina a memória dos movimentos. Cada um desses tipos apresenta sub-tipos: os visuais terão, uns, a memória das cores, outros, a das formas; os auditivos conservarão melhor uns, os sons musicais, outros, os ruídos, etc. Na realidade, porém, não existe tipo puro. Pesquisas recentes têm revelado que, salvo aptidões excepcionais, a maioria dos indivíduos pertence ao tipo misto, em que as diversas memórias são, mais ou menos, de idêntica importância. Mesmo quando há predomínio de certas imagens, esse predomínio não se verifica em todas as operações mentais: um visual para as palavras pode ser auditivo para os números. No que concerne à linguagem, é a memória auditiva a dominante em quase iodos os homens. Além disso, o tipo mnemónico, é menos estável do que se acreditou até agora. Sob a influência do exercício, um tipo determinado pode sofrer uma transformação completa, por exemplo, o auditivo torna-se visual. (Piffault)
b)Memória intelectual — é a memória das idéias, das ilustrações. É a memória dos sábios, ainda que diferenciada no físico, no naturalista, no matemático, no filósofo, no historiador, em cada um dos quais ela apresenta caracteres particulares.
c)Memória afetiva — é a memória das imagens afetivas. Estas imagens se associam com representações mentais, de modo que a lembrança de um acontecimento pode reviver os sentimentos e as emoções que o acompanharam durante sua realização. Há, portanto, uma memória dos processos afetivos.

II. NATUREZA DA MEMÓRIA

5. Estrutura da memória. — No fenômeno da memória Kaploum distingue a conservação das representações e a conservação dos conhecimentos. Na sua opinião, um fato percebido ou pensado deixa no espírito uma representação e um conhecimento. Por um lado, pode-se rever o fato em sua forma sensível; por outro, é possível "saber-se" que ele está presente, sem que seja necessário representá-lo. Quase sempre, o conhecimento é o único presente. Sem representarmos o fato, "sabemos” que o mesmo se realizou. Esta espécie de conservação é um processo intelectual; situa-se, implicitamente, o fato no espaço e no tempo e pensa-se, virtualmente, na sua origem e importância. Esta relação abrange todos os fatos passados, mas o conhecimento latente de um fato é tanto mais esquemático e empalidecido quanto mais antigo é esse fato.
Há uma categoria de conhecimentos latentes de suprema importância para a nossa atividade de cada momento: é a que compreende os fatos "presentes" e que condiciona a nossa conduta. São conhecimentos porque os objetos a que se referem não são atual e conscientemente, percebidos. Mas, por não serem percebidos, nem por isso deixam de ser enérgica e atualmente "conhecidos". A massa desses conhecimentos nos envolve e colabora em todas as nossas ações.
Basta analisar, sumariamente, a menor das nossas ocupações conscientes para discernir toda a atividade, ao mesmo tempo inteligente e inconsciente que se encontra na base da corrente dos nossos pensamentos claros. Assim, andamos, discutindo calorosamente; nosso espírito está inteiramente absorvido pela discussão — e, entretanto, nos orientamos com precisão, evitamos os obstáculos que encontramos, seguimos com segurança nosso caminho, sem pensar somente na palestra em que estamos absorvidos, "sabemos", ao mesmo tempo, a cidade, o quarteirão, a rua, a casa, o andar em que nos encontramos, quem é aquele que visitamos, sua profissão, sua posição social, seu caráter, suas relações, seus parentes, o papel que desempenha ou pode desempenhar em nossa vida, o objetivo da nossa visita, etc. etc.
Não podemos deixar de considerar esses conhecimentos sempre presentes em nosso espírito porque, a todo o momento, eles nos fornecem dados e exercem influência sobre nossos pensamentos. Esses conhecimentos latentes se modificam e se adaptam a cada situação nova. Portanto, durante a vigília, o conjunto dos conhecimentos relativos aos fatos particulares da nossa vida, se encontra, incessantemente, na base do trabalho consciente do nosso espírito. Esses conhecimentos estão sempre à nossa disposição e é a sua presença contínua que permite que nossa atividade psicológica esteja, na vigília, adaptada à realidade. Daí a observação de Bergson de que o nosso passado está sempre presente em nosso espírito, "de tal maneira que nossa consciência para experimentá-lo, não precisa sair de si mesma, nem ser acrescida de alguma coisa estranha".
A psicologia tradicional tem considerado na memória, sobretudo, a conservação das representações. Mas, na maioria dos casos, a representação dos fatos não é evocada, já por ser inútil, já porque a rápida sucessão dos pensamentos não deixa tempo para isso. A representação dum fato passado e o seu conhecimento, por pertencerem ambos à memória não são menos separáveis e de natureza diversa. A representação pode estar ausente: sabe-se, por exemplo, que se ouviu uma melodia, com tal dia, em tal lugar, que tem um tal sentido, mas a imagem auditiva não aparece; ou, então, lembra-se perfeitamente ter conhecido tal pessoa, sabe-se que ela tem tal profissão, que possui tais relações com outras pessoas, mas não se consegue evocar sua fisionomia ou seu nome. Inversamente, pode acontecer que, às vezes, a imagem apareça, sem que se
consiga conceber o seu lugar no sistema ordenado dos nossos conhecimentos. É comum, por exemplo, não se saber qual a canção que se trauteia ou a quem pertence tal sorriso que se torna a ver.
Conquanto formas de memória, essas duas espécies de conservação são muito diferentes em sua natureza. Os conhecimentos estão em contínua atividade e, por não se realizarem representativamente, os fatos que eles exprimem não pesam sobre nossos pensamentos. Certos conhecimentos chegam a se manter ou a se transformar, sem que, para isso, se verifique representação explícita, como a noção de nossa situação no espaço ou a noção da hora. As representações, ao contrário, devem ser evocadas por um ato mental próprio para se tornarem presentes. Esta dupla conservação corresponde à dupla conservação da percepção que é, ao mesmo tempo, sensível e intelectual, passiva e ativa. Enquanto a imagem sensível de um fato torna à obscuridade desde que o mesmo desaparece, para só ressurgir pela evocação, seu conhecimento fica presente, implicitamente, no espírito, mesmo após o desaparecimento do fato. (Kaploum)
As curiosas experiências de Abramowsky sobre a “resistência do esquecido" oferecem, indubitavelmente, uma comprovação experimental a esses caracteres da memória. Abramowsky verificou que a lembrança, embora latente, manifesta de alguma maneira sua presença invisível em nosso pensamento. Se na minha recordação de uma cena há uma lacuna; se, por exemplo, há personagens presentes à referida cena cuja representação não consigo evocar, essa lacuna não constitui um vácuo absoluto. Se me afirmarem que é uma criança que lá se encontrava, eu o contestarei energicamente; e o contestarei até me fornecerem uma solução verdadeira. Logo, a lembrança, ainda que invisível, "resiste". Poder-se-á supô-la ausente; ela, porem, manifestará sua presença e não se deixará suplantar por outra.
Na verdade, sentimos perfeitamente na vida cotidiana que lembranças inconscientes não cessam de agir e de influir sobre nossa vida psicológica. Elas orientam e equilibram nosso espírito. Se deixássemos, um só instante, de saber, ainda que não pensemos nisso, quais são nossa situação social, nossa família, nossa cidade, nosso país, os grandes acontecimentos que caracterizam nossa época, enfim, todos os fatos relacionados com a nossa existência, cairíamos em plena alienação ou em pleno sonho.

6. Patologia da memória. - São as seguintes as principais doenças da memória.
a)Amnésia — é a perda total ou parcial da memória. A amnésia total pode ser: temporária ou definitiva, periódica ou progressiva, anterógrada (incapacidade de adquirir lembranças novas) ou retrógrada (quando se perdem as lembranças
já fixadas). A amnésia parcial pode apresentar diversas formas: afasia ou incapacidade de falar, pelo esquecimento dos sinais vocais ou dos movimentos da palavra (afasia motora); agrafia ou amnésia dos sinais gráficos, acarretando a incapacidade de ler ou escrever.
b)Hipermnésia — exaltação da memória, tal como se verifica no sonho, na hipnose ou nos moribundos.
c)Paramnésia — perturbação da memória que nos faz confundir o presente com o passado e julgar ver de novo aquilo que vemos pela primeira vez. É a ilusão do "já visto" que, para alguns autores, é antes uma alteração da percepção
do que da memória.

7. Função da memória. — A memória toma parte em todas as manifestações da vida psicológica. Não deixa, um momento, de exercer sua função de inserir o passado no presente, de atualizar, de acordo com as necessidades de cada instante, as experiências anteriores. Eis porque a memória é condição básica do desenvolvimento intelectual. Seria, efetivamente, impossível a realização de qualquer progresso no domínio da inteligência, se os conhecimentos se desvanecessem à medida que fossem adquiridos.Tornar-se-ia, então, necessário recomeçar, perpetuamente, o ciclo de nossas experiências cognitivas.
A memória não representa, por conseguinte, uma função especial da vida psíquica. Constitui antes a atividade total da inteligência. Na verdade, a memória é a própria consciência enquanto realiza a sua continuidade. Graças a ela, o trabalho da consciência se desenvolve com firmeza e sem interrupção, assegurando a unidade e o equilíbrio de toda a nossa vida interior.

Exercícios
1. Esclarecer a definição de memória.
2. Enumerar e esclarecer as capacidades da memória.
3. Caracterizar as condições orgânicas e psíquicas da memória.
4. Distinguir os caracteres da memória.
5. Assinalar os tipos de memória.
6. Explicar a estrutura da memória.
7. Descrever as doenças da memória.
8. Mostrar a função da memória na vida psíquica.

SEGUNDO ANO AULA 5 - PERCEPÇÃO E SENSAÇÃO


A SENSAÇÃO E A PERCEPÇÃO.

I. NOÇÃO DE SENSAÇÃO.

1. Definição de sensação. — A sensação pode ser definida como um fenômeno psicológico produzido pela ação de um objeto sobre um órgão sensorial. A sensação é o resultado da transformação no cérebro de uma impressão originada de uma excitação provocada pelos objetos do mundo exterior. A sensação, no estado puro, nos permite apreender qualidades, sensíveis e não coisas propriamente dita. E, como raramente se encontra isolada, a sensação, quase sempre, representa antes o “resultado de uma abstração mental do que o fruto espontâneo de uma experiência psíquica".Deve, por isso, ser considerada como elemento da percepção e como manifestação intuitiva mais simples da consciência.

2. Condições orgânicas e psíquicas. — Para que se realize o fenômeno da sensação são necessárias três condições fundamentais:
a) Excitação — ação de um excitante ou agente provocador sobre o órgão sensorial. Os excitantes podem ser: mecânicos (choques, picadas, etc.), físicos (luz, som, calor, eletricidade) ou químicos (substâncias cáusticas, irritantes, etc).
b) Impressão — modificações orgânicas que se processam nos órgãos sensoriais e que se transmitem por fibras nervosas aos centros cerebrais.
c) Sensação — estado de consciência resultante dos processos anteriores.
A primeira condição é de natureza físico-química. Só podemos explicá-la pela física e pela química. A segunda é de natureza fisiológica. Sua explicação é privativa da biologia. Somente a terceira condição é de natureza psicológi

3. Elementos da sensação. — Toda sensação é integrada pelos seguintes elementos:
a) Um conhecimento — apreensão de uma qualidade sensível (som agudo, cor azul, sabor ácido, etc.);
b) Um estado afetivo — tonalidade agradável ou desagradável ligada a essa apreensão;
c) Uma atividade — movimentos realizados pelos órgãos sensoriais.

4. Classificação das sensações. — A divisão clássica em cinco sentidos corresponde a noções incompletas sobre a natureza e a função dos órgãos sensoriais. Segundo Cuvillier, essa divisão é insuficiente, não só do ponto de vista anatômico como do ponto de vista psicológico. Do ponto de vista anatômico, está estabelecido que o tato pode ser decomposto em 4 ou 5 sentidos elementares, tendo, cada um, seus órgãos receptores distintos. Do mesmo modo, o ouvido compreende dois órgãos sensoriais: o da audição e o do equilíbrio. Do ponto de vista psicológico, para a consciência, uma sensação de frio difere tanto de uma sensação de contato, quanto uma sensação visual difere de uma sensação auditiva.
Na realidade, podemos distinguir dez espécies de sentidos que deverão ser classificados da seguinte maneira: Sensações internas, correspondendo às impressões provenientes do interior do organismo; são as sensações sinestésicas;
a) Sensações motoras, correspondendo às impressões provenientes da atividade do próprio organismo; são as sensações: 1) estáticas ou de equilíbrio; 2) quinésicas ou de movimento;
b) Sensações externas, correspondendo aos receptores que captam as excitações vindas do exterior e dos quais, uns, são impressionáveis por excitantes agindo por contato ou proximidade imediata: 1) sensações táteis; 2) sensações térmicas ou de calor e de frio; 3) sensações álgicas ou de dor; 1) sensações gustativas ou de paladar; e, outros, são impressionáveis por excitantes agindo à distância: 1) sensações olfativas; 2) sensações auditivas; 3) sensações visuais ou óticas.
A cada um desses sentidos corresponde um órgão especial: para as sensações visuais, os olhos; para as sensações auditivas, os ouvidos; para as sensações olfativas, a mucosa nasal; para as sensações gustativas, a língua; para as sensações táteis, térmicas e álgicas, terminações nervosas especiais; para as sensações estáticas ou de equilíbrio, os canais semi-circulares do ouvido interno; para as sensações sinestésicas ou de movimento,os nervos sensitivos dos músculos, das articulações dos membros e das cápsulas membranosas que os revestem. As sensações quinésicas ou de movimento nos informam sobre a posição dos membros e os movimentos que com eles executamos.

5. Caracteres da sensação. — a) Toda sensação transmite um ensinamento do mundo exterior. Estes ensinamentos constituem um fundo original, donde resultam, após uma elaboração todos os nossos conhecimentos.
b) A sensação é distinta da propriedade do objeto que a provoca. Segundo Taine, esta distinção "se faz comodamente, pois a propriedade pertence ao objeto e não a nós, ao passo que a sensação pertence a nós e não ao objeto".
c) A sensação é distinta do processo fisiológico que a condiciona. Todo fenômeno fisiológico se reduz, em última análise, a uma modificação física ou química, enquanto que a sensação, como fato da consciência, é um processo puramente psicológico.
d) A sensação é essencialmente qualitativa. A sensação,sendo um fato da consciência, é um fenômeno qualitativo, susceptível de maior ou menor intensidade, mas que só pode ser observado, diretamente, por aquele no qual se realiza, não podendo, portanto, ser objeto de mensurações quantitativas.
e) Para que haja sensação é necessário que a excitação
possua uma intensidade mínima. A esta intensidade mínima
da excitação capaz de produzir a sensação dá-se o nome de "limiar da intensidade da sensação".
f) A sensação, uma vez produzida, não desaparece logo, persistindo ainda durante algum tempo. Por essa razão, excitações seguidas, sucedendo-se com pequenos intervalos, são sentidas ou percebidas como uma única excitação. É o que acontece com as imagens cinematográficas.

6. Sensação e percepção. — As excitações que impressionam os nossos sentidos podem provocar em nós fenômenos diversos: ou são vagamente sentidas como impressões mais ou menos intensas e mais ou menos agradáveis; ou são, ao mesmo tempo, reconhecidas e interpretadas como sinais de objetos exteriores. À sensação interpretada, desta maneira, chamamos de percepção. A sensação, no primeiro caso, nos dá apenas a noção de uma qualidade ou de um estado (cor verde ou amarela, perfume suave ou intenso, som fraco ou forte), ao passo que, no segundo caso, como percepção, sugere a noção de um objeto determinado (cor de uma laranja, perfume de uma rosa, som de um violino).
A percepção implica a "crença" na realidade exterior e um sentimento de "objetividade". Acompanha-se ainda de um verdadeiro "juízo de exterioridade". Essas reações mentais não resultam, somente, da visão do objeto. Nelas toma parte o cabedal de nossas experiências passadas. A percepção é um fenômeno complexo em que se reúnem, numa síntese, várias operações psicológicas: sensações, memória, associação, comparação, juízo, etc.

II. NATUREZA DA PERCEPÇÃO

7. Estrutura da percepção. — O mecanismo da percepção é objeto de divergência entre os psicólogos. Segundo a psicologia associacionista, a percepção é um conjunto de sensações que a associação une num todo homogêneo e ao qual a atenção confere clareza e nitidez. A sensação, a associação e a atenção representam, de acordo com esse ponto de vista, os elementos fundamentais do processo perceptivo. A Psicologia da Forma ("Gestalt-Psychologie") defende uma concepção diversa. Enquanto a psicologia associacionista considera a percepção como uma simples combinação de sensações elementares, a Psicologia da Forma concebe a percepção como uma síntese, como uma estrutura, como uma forma ("Gestalt"), constituída de elementos sem significação isolada, cujo valor não depende de atributos próprios, mas tão somente de sua posição no conjunto.

8. Caracteres da percepção. — Segundo a Psicologia da Forma, a percepção possui os seguintes caracteres fundamentais:
a) A estrutura da percepção possui uma organização própria. Ela unifica as partes e lhes dá uma significação. Há, assim, uma solidariedade íntima entre as funções exercidas por es elementos.
b) A estrutura da percepção possui um relevo próprio. Nela se revela um fundo sobre o qual se destaca uma figura. A qualquer instante, o fundo pode converter-se em figura.
c) A estrutura da percepção possui uma tendência a encerrar-se em si mesma. Manifesta-se como tendência a absorver os elementos novos que sejam assimiláveis e a repelir os que se mostrem demasiadamente estranhos. Por isso, a parte incorporada a um conjunto perde, quase sempre, a sua individualidade.

9. Erros da percepção. — a) Ilusões — o hábito de perceber as sensações sempre sob certas condições faz com que, todas as vezes que uma delas aparece fora de suas relações normais, a interpretemos erroneamente. Estes erros de percepção constituem as ilusões. As ilusões podem se originar de todos os sentidos, mas não provêm de sensações falsas ou erradas, mas sim de juízos falsos, de interpretações errôneas de sensações. As causas das ilusões são diversas:
1) Certas circunstâncias físicas — o meio que se interpõe, o movimento, a distância (uma bengala mergulhada n’água parece quebrada, uma torre vista ao longe parece quadrada, etc.).
2) Certos estados fisiológicos — o daltonismo impede a visão do vermelho, etc.
3) Certos estados psicológicos — a desatenção, a prevenção, o medo, etc.
4) Certos, estados patológicos — a febre torna os alimentos sem sabor.
b) Sonhos — resultam da atividade do espírito durante o sono. Antes, porém, do adormecer, na fase intermediária entre a vigília e o sono, surge, freqüentemente, em nosso espírito, uma floração contínua de imagens simples, rápidas, despidas de intelectualidade e revestidas de um colorido afetivo, às vezes, muito intenso. Essas imagens são chamadas "hipnagógicas". Quando imersos nesse estado, temos o sentimento confuso do caráter alucinatório dessas imagens, sabemos que sonhamos e que bastaria abrir os olhos para interromper essa seqüência de imagens múltiplas e fugazes.
Se adormecermos completamente, essas imagens dominam e anulam as percepções e caímos, então, em pleno sonho. As imagens assumem, daí por diante, um aspecto francamente alucinatório e tendem a se dramatizar, isto é, a se ordenar sob a forma de um "assunto", muitas vezes, absurdo, estranho, bizarro. Essa dramatização das imagens é o resultado dessa tendência espontânea que possui o espírito para as construções lógicas.
As representações do sonho têm sempre uma relação, direta ou indireta, consciente ou inconsciente, com as experiências passada e, sobretudo, com os fatos ou pensamentos do dia imediatamente anterior. A memória e a imaginação são os fatores dominantes na gênese das representações do sonho, às quais se associam as imagens suscitadas pelas impressões sensoriais que ocorrem durante o sono. As sensações internas ou viscerais têm uma influência manifesta sobre a gênese das emoções oníricas. Daí os pesadelos, sempre de origem sinestésica. A consciência no sonho é a vida psíquica espontânea, elementar. A consciência na vigília é a vida psíquica organizada. Donde a semelhança da consciência onírica com a consciência Infantil.
Se o sonho influi sobre os centros motores do indivíduo, irmos o sonambulismo, em que o sonho se transforma em ação. O caráter alucinatório das imagens é de tal modo imperioso que domina a motricidade, enquanto que as sensações normais se tornam subconscientes. Estas não ficam, entretanto, abolidas: o sonâmbulo é capaz de uma certa adaptação ao meio exterior e pode obedecer a certas sugestões orais. (Piffault)

10. Patologia da percepção. — As alterações patológicas da percepção podem ser de caráter qualitativo ou quantitativo. Vejamos as principais:
a) Hiperpercepção — Aumento de intensidade das percepções, acompanhado, geralmente, de exaltação da atividade psíquica. Em certas neuroses, caracteriza-se por uma capacidade exagerada de ver, ouvir e sentir, provocando, por isso, um estado angustioso no doente.
b) Hipopercepção — Diminuição de intensidade das percepções, acompanhada de enfraquecimento da atividade psíquica. Observa-se nos estados psicastênicos, nas síndromes depressivas, nas esquizofrenias, etc.
c) Micropsia — Os objetos são percebidos com dimensões reduzidas. d)Macropsia — Os objetos são percebidos com dimensões aumentadas.
d) Multipsia — Os objetos são percebidos multiplicados várias vezes.
e) Discromopsia — os objetos são percebidos com cores diferentes das que possuem normalmente.
g) Alucinação — É a percepção sem objeto. O alucinado acredita perceber o que realmente não existe. As alucinações podem se originar de alterações dos órgãos dos sentidos e do sistema nervoso ou de perturbações mentais.
11. Funções da percepção. — A percepção constitui o principal instrumento de aquisição da experiência humana. Por meio das sensações, recolhe do mundo exterior os elementos, que, trabalhados pela inteligência, vão constituir o vasto cabedal dos nossos conhecimentos, a nossa "fortuna psicológica". Daí o velho aforismo: "Nihil est in intellectu quod non antea in sensu fuerit", nada existe na inteligência que antes não haja passado pelos sentidos.
Além de fatores da gênese e enriquecimento da nossa experiência, as percepções, por intermédio das sensações, desempenham ainda o papel de instrumentos de adaptação do nosso psiquismo ao universo e à vida. É assim que as sensações orgânicas mantêm o equilíbrio vital necessário ao funcionamento normal dos nossos órgãos. Do mesmo modo, as sensações visuais, auditivas, tácteis, olfativas, térmicas etc. realizam o ajustamento harmonioso do ser humano ao meio ambiente. Enfim, é através da percepção que se processa a "função do real", considerada por Pierre Janet como o fenômeno psíquico mais alto, mais delicado e mais complexo, graças ao qual o espírito do homem consegue ajustar-se, com precisão, às situações e aspectos cambiantes da realidade.

EXERCÍCIOS.
1. Esclarecer a definição de sensação.
2. Caracterizar as condições psíquicas e orgânicas da sensação.
3. Distinguir os elementos da sensação.
4. Classificar as sensações.
5. Assinalar os caracteres da sensação.
6. Distinguir sensações e percepção.
7. Explicar a natureza da percepção.
8. Esclarecer a origem dos erros da percepção.

SEGUNDO ANO AULA 6 - LIBERDADE


Liberdade
O problema da liberdade é um problema filosófico tradicional, não por se ter colocado sempre da mesma forma, mas, antes, porque, na diversidade das problemáticas que a ele conduzem e permitem uma variedade de soluções, é de algum modo sempre a questão do estatuto de um certo tipo de ser que se encontra em jogo. A maneira como se pensa o fato de se ser livre está sempre em relação não só com a maneira como se pensa o homem, mas ainda com a maneira como se pensa a ligação desse ser com aquilo que constitui o ser da natureza. A dificuldade e a complexidade do problema provêm sem dúvida do paradoxo que constitui em si própria esta articulação: determinar o ser-homem como ser-livre é arrancá-lo à natureza, e conceder-lhe o ser-natureza é arrancá-lo à liberdade.

1. O fato de se ser livre
A liberdade corresponde antes do mais ao sentimento experimentado por uma consciência: penso em levantar o meu braço, e levanto-o, posso não querer fazer alguma coisa, adiar para mais tarde uma decisão. Neste sentido, a liberdade é a relação de uma consciência com os seus atos (Bergson). Mas este sentimento é de imediato a experiência de um limite, de uma resistência; posso querer fazer seja o que for, mas isso não quer dizer que consiga fazê-lo. Por um lado, esbarro em coisas, numa matéria que possui uma ordem própria independente da minha vontade. Por outro lado, quando dou uma ordem, quando procuro convencer ou peço alguma coisa a outrem, a minha vontade nem sempre resulta. Neste malogro, tenho a experiência de uma oposição por meio da qual encontro a liberdade e a vontade de outrem.
Reconheço, pois, a minha liberdade pelo que posso fazer quando o quero, e reconheço os limites da minha liberdade pelo que não.posso fazer quando o quero. Mas, inversamente, posso querer fazer seja o que for, ou até mesmo recusar-me a querer seja o que for, se é possível que faça afinal o que não quis. Há assim duas categorias de atos livres:
1 - os que cumpro segundo a minha vontade;
2 - o próprio ato de querer, pois que posso sempre querer. A minha liberdade
reside portanto, essencialmente, no fato de querer; é por isso que a linguagem
quotidiana associa sempre o ato livre à intenção ou ao projeto de um sujeito, ao
qual justamente imputa uma responsabilidade.
Esta análise da linguagem* e do sentimento comum na compreensão do ser-livre esconde uma dificuldade: se posso fazer o que não quis, não será possível que, quando quero, não queira afinal o próprio ato de querer? Inversamente, se posso sempre querer, sou por completo liberdade: como poderia não ser livre não querendo o que faço? Ao levantarmos estas interrogações, pomos a vontade entre os objetos, e o sujeito entre os atos: a linguagem subjetiva utilizada até aqui já não pode assim servir para as resolver.

2. O ser-natureza e a liberdade
Pensar alguma coisa como um objeto é determinar esse alguma coisa; a natureza é essencialmente uma ordem de determinações. Podemos pensar estas determinações diversamente; pode tratar-se de uma pré-inscrição da ordem das coisas no pensamento de algum deus - fatalismo religioso -; pode tratar-se de uma necessidade lógica; pode tratar-se, sobretudo, de causalidade natural.
Para compreendermos o mundo, temos de lhe supor um princípio de determinação; se o mundo é compreensível, não será a liberdade que é incompreensível? Como é efetivamente preciso que o mundo seja compreensível, é então a liberdade que se torna um problema. De resto, se não afirmarmos um determinismo, a própria liberdade deixa de ter sentido: não só devemos conceber a vontade como a causa da existência daquilo que queremos, mas ainda, se não houvesse encadeamentos causais necessários na natureza, não se vê como poderia resultar alguma coisa do que quiséssemos. O que nos torna livres é neste sentido o conhecimento das cadeias causais naturais. Mas se existem cadeias causais naturais, o que acontece depende delas; saber como a liberdade é possível equivale a saber como colocar a vontade em relação a tais encadeamentos. São pensáveis diversas soluções.
1 - Admitir Que a própria ordem da natureza não é necessária, mas contingente:
Aristóteles garante esta contingência por meio da sua concepção da potência; os
epicuristas, por meio do clinamen. Mas, se o que vai acontecer é indeterminado,
qualquer previsão se torna impossível.
2 - Admitir que a ordem do mundo é necessária e que, pertencendo à natureza
as ações humanas, aquilo que nos acontece depende da ordem das coisas, não
tendo nós sobre isso qualquer poder. Esta tese pode parecer adotar o fatalismo e
negar toda a liberdade; se se admitir contudo que a vontade é uma causa livre
(depende só dela querer o que quer), uma vez que a liberdade consiste em fazermos o que queremos, como aquilo que fazemos não depende de nós, aquele que quer o que lhe acontece poderá, apesar de tudo, dizer-se livre.
3- Admitir que a ordem do mundo é necessária e que a própria vontade faz
parte dela, ou, por outras palavras, que não é uma causa livre: somos determinados para querer esta coisa ou aquela, e não podemos querer indiferentemente seja o que for. Espinosa, que é o primeiro a formular semelhante hipótese, admite toda via a existência da liberdade. Podemos resumir do seguinte modo a sua argumentação, embora ela só se torne inteiramente inteligível no contexto da sua doutrina: se conhecemos a causa pela qual queremos, se essa causa é ela própria a causa do nosso conhecimento, o nosso querer não difere do conhecimento da sua causa; então, o conhecimento da sua causa não difere da causa do nosso querer, caso contrário não seria a causa do nosso conhecimento. Por conseguinte, somos livres na medida em que temos um conhecimento verdadeiro das coisas, uma vez que então somos nós a causa da nossa vontade.
A liberdade coloca sempre um problema ontológico. Poderia pensar-se que a maneira mais simples de o resolver é admitir que a vontade não pertence à natureza e que, nesse sentido, não se encontra submetida à ordem natural. De resto, a própria noção de sujeito parece impor semelhante solução ao pensamento moderno. Mas a nossa liberdade no mundo não pode ser pensada fora da nossa relação com a ordem natural, uma vez que os nossos atos nela se inserem: a dificuldade reaparece aqui. Descartes, que dota a substância pensante de uma liberdade infinita, falha ao pensar a relação entre o espírito e a matéria; Kant vê-se obrigado a fazer do sujeito livre uma simples condição de existência da lei moral.

3. A filosofia do espírito e a realidade da liberdade
Até aqui, tentamos pensar a realidade da liberdade como a propriedade de um sujeito ou a contingência de uma natureza. Se a natureza é o lugar da necessidade, devemos sem dúvida procurar fora dela a realidade da liberdade. Poderíamos procurá-la no confronto das vontades individuais e mostrar que o querer se realiza não no arbitrário, mas na ordem social, política, cultural. Quando Hegel estabelece a própria sociedade como realidade da liberdade, obedece a preocupações ontológicas; a liberdade é a substância da sociedade e o seu destino, porque o espírito cuja realidade é a sociedade é pressuposto por ela e ao mesmo tempo, dela se não distingue: determina-se como esta ou aquela sociedade onde concretamente se realiza esta ou aquela forma de liberdade Contudo, podemos reter aqui dois pontos:
1 - A liberdade assim concebida não é propriedade inata de um sujeito individual.
2 - A sua realidade é uma forma de sociedade.
Manter que a liberdade considerada por referência à sociedade corresponde ao livre arbítrio de um sujeito não nos faria avançar a respeito da discussão precedente: tal como há leis naturais, há leis psicológicas e sociológicas. Mas, se a liberdade, como o senso comum reconhece, consiste em fazer aquilo que se quer, a sua condição de existência é que possamos fazer tudo o que possamos querer. Por conseguinte, tudo aquilo que, numa sociedade, nos impede de fazer o que queremos é contrário à liberdade: e cada novo direito é um novo progresso da liberdade. A liberdade política pode conceder-se independentemente de problemas ontológicos, porque, na reivindicação de um direito, de uma lei, o que importa é que o queiramos e que ele ou ela exista. Que tenhamos um livre arbítrio e que seja a nossa vontade livre que nos impele na reivindicação, ou que certos determinismos a isso nos conduzam, estando nós encerrados num curso necessário da história, é uma questão indiferente: o limite da nossa liberdade não é, neste caso, uma ordem natural, mas a liberdade dos outros, ou seja, o seu direito.

SEGUNDO ANO AULA 7 - AUTONOMIA


AUTONOMIA D.Autonomie; E. Autonomy; F. Autonomie; I. Autonomia.
Etimologicamente condição de uma pessoa ou de uma coletividade autônoma, quer dizer, que determina ela mesma a lei à qual se submete. Cf. Heteronomia.
A. sociologia. Poder de um grupo, principalmente de um grupo político, de se organizar e de se administrar ele mesmo, pelo menos sob certas condições e dentro de certos limites. (Sem estas reservas a autonomia seria soberania.) Ex.: Autonomia comunal, colonial.
B.ética. A autonomia da vontade para Kant é a característica da vontade pura enquanto ela apenas se determina em virtude da sua própria essência, quer dizer, unicamente pela forma universal da lei moral, com exclusão de todo motivo sensível. Kritik der prakt. Vern., livro I, cap. I, proposição IV.
C.Liberdade moral, enquanto esta do de fato, oposto, por um lado, à escravidão dos impulsos, por outro, à obediência sem crítica às regras de conduta sugeridas por uma autoridade exterior. "É esta servidão que os homens chamam heteronomia; e eles lhe opõem, com o nome de autonomia, a liberdade do homem
que, pelo esforço da sua própria reflexão,dá a si mesmo os seus princípios de ação.O indivíduo autônomo não vive sem regras, mas apenas obedece às regras que ele escolheu depois de examiná-las." B.Jacob, Devoirs, "Definamos o indivíduo autônomo" (em oposição à autonomia absoluta de Kant) "como aquele que se determina,não apenas pela sua razão, mas ao mesmo tempo pela sua razão e por aquelas das suas tendências que concordam com ela.”

SEGUNDO ANO AULA 8 - ÉTICA




ÉTICA

I. NOÇÃO DE ÉTICA

1. Definição. — Ética ou moral é o estudo da ação humana enquanto livre e pessoal. Sua finalidade é traçar normas á vontade na sua inclinação para o bem. Pode, portanto, ser definida como a ciência que trata do uso que o homem deve fazer da sua liberdade para atingir seu fim último.
Alguns filósofos definem a moral como a "ciência dos costumes" (Dürkhein, Levy Bruhl). Esta definição é incompleta, uma vez que a moral não se limita apenas a conhecer ou descrever os costumes, visando antes os dirigir e orientar, de acordo com os princípios da ética.

2. Método. — O método da moral, ciência normativa, deve ser, necessariamente, misto, isto é, ao mesmo tempo, indutivo ou experimental e dedutivo ou racional. Com efeito, tratando-se de formular as leis da atividade moral, é preciso, antes de tudo, conhecer a natureza do homem para, em seguida deduzir desse conhecimento os princípios mais gerais da conduta humana.
Segundo Spencer, para quem a moral é simples fato da natureza, o método da ética é "a posteriori". Este ponto de vista é criticável, pois da experiência não se pode tirar normas de ação. Sendo livres, os atos humanos não possuem a regularidade dos fenômenos naturais. Portanto, uma moral baseada somente na observação chegaria a conclusões contraditórias.
Ao contrário de Spencer, Kant postula que a moral é um problema puramente metafísico e que, por conseguinte, seu método deve ser "a priori" e independente do conhecimento da natureza humana. Neste caso, estabelecido o princípio da obrigação, basta apenas deduzir do mesmo as normas da ação prática. Esta teoria é também criticável, de vez que é impossível estabelecer como o homem deve agir, sem conhecer o que ele é e como pode agir. As normas de atividade moral devem ser baseadas na natureza humana a fim de que possam ser realizadas.

3. Condições. — Três condições são necessárias para o exercício da vida moral: a) a razão, pois só por meio da inteligência pode o homem conhecer o fim para que é inclinado, a lei que deve observar e as conseqüências resultantes do seu cumprimento ou da sua transgressão; b) o livre arbítrio pois seria contraditório e inútil obrigar a seguir uma lei moral que se acha de antemão determinado; por outro lado, não se pode tornar ninguém responsável por atos alheios à sua vontade; c) a inclinação, pois se o homem não tivesse uma tendência natural para o bem, nunca o poderia alçam uma vez que, para isso, "não é suficiente conhecer a lei pela razão nem submeter-se a ela, sem constrangimento, pela liberdade”.

4. Evolução. — Quatro doutrinas básicas poderão ser assinaladas ao longo da evolução histórica da ética: a ética empírica, a ética dos bens, a ética formal e a ética dos valores.
a) Ética empírica — Seu fundamento é a experiência. Seu ponto de vista é que a teoria da conduta humana deve partir do exame da vida moral. As normas do comportamento ético derivam da própria atividade livre do homem. A observação dos fatos é, portanto, o caminho para se atingir os princípios e as regras morais. A idéia do dever perde, nesta doutrina, toda significação, uma vez que o homem deve ser como é. Iniciada pelos sofistas, a ética empírica tem sido defendida pelos relativistas, e materialistas de todos os tempos.
b) Ética dos bens ou dos fins. — Ao contrário do empirismo relativista, esta doutrina admite a existência de um valor absoluto que é o bem supremo. Seu ponto de partida é a natureza essencialmente finalista da atividade humana. O homem age teologicamente, isto é, se propõe fins para cuja realização emprega certos meios. A realização do fim de cada atividade constitui o bem específico da mesma. O que se afirma de cada ato particular, pode-se afirmar da existência inteira. O bem supremo da vida consiste na realização do fim último e absoluto do homem que é Deus. Esta doutrina ética iniciada pela filosofia grega, sobretudo, por Aristóteles, encontrou sua expressão mais perfeita no pensamento de Sto. Tomás de Aquino.
c) Ética formal. — Esta doutrina, construída por Kant, admite que a significação moral dos atos humanos reside, não na satisfação das tendências ou na realização dos fins, mas na retidão dos propósitos. Dentro deste ponto de vista, "a concordância externa entre a conduta e a norma é simples legalidade, que nada indica sobre o valor ético da ação". Esta só é moralmente valiosa quando, além de concordar com que a norma prescreve, realiza o dever pelo próprio dever, isto é, pelo respeito à exigência ética, independentemente de qualquer interesse ou prazer. A norma básica da ética formal de Kant é o imperativo categórico que assim se formula: "proceda sempre de tal modo que o princípio de sua ação possa ser elevado à categoria de lei universal".
d) Ética dos valores. — Esta doutrina estabelece que o fundamento do ato moral se encontra no valor.Só deve ser o que é valioso e o que é valioso deve ser. Os atos são qualidades objetivas das coisas e pessoas. Não resultam de apreciações subjetivas, existindo, pelo contrário, por si mesmos.Os valores uma hierarquia com a qual se relacionam os atos morais. A significação ética dos atos humanos depende da maneira pela qual os valores são realizados pela personalidade. Max Scheler e Nicolai Hartnann são os representantes mais autorizados da ética dos valores, que vem exercendo uma influência cada vez maior sobre certas correntes do pensamento filosófico contemporâneo.

5. Divisão. — Há na vida moral dois aspectos essenciais a considerar: a) o dever, considerado em si mesmo e em suas conseqüências necessárias; b) os atos diversos, dirigidos pelo dever. Há portanto, na lei moral uma forma imutável e uma matéria variável. Daí duas grandes divisões da moral:
a) Moral formal ou geral, que investiga qual é para o homem o bem absoluto e universal: é a ciência do dever e suas conseqüências.
b) Moral material ou particular, que determina, para todo o domínio das ações morais, o que, nos casos particulares, é o verdadeiro bem do homem, conforme o bem absoluto e universal previamente estabelecido: é a ciência dos deveres.

II. NATUREZA DA ÉTICA

6. Caráter científico da ética. — Diz-se que a ética é ciência porque constitui um sistema de conclusões baseadas em princípios universais. Por isso, assim como se distingue do simples bom senso, a ética se distingue do senso moral, que é uma espécie de moralidade natural.
A ética é uma ciência normativa porque estuda os princípios que devem governar a ação humana. Apesar de ciência normativa, a moral possui também um caráter especulativo e racional. O problema moral é de natureza racional e filosófica e a moral visa, antes de tudo, formular princípios universais. Mas esses princípios se referem à atividade pratica, pois representam as normas universais que deve orientar a ação livre e pessoal do homem.
A existência de uma ciência moral ou ética não significa a possibilidade de uma moral cientifica. Os positivistas e os evolucionistas, como Augusto Comte, Stuart Mill, Herbert, Spencer e Emílio Dürkheim concebem a ética como ciência positiva dos fatos morais ou das leis empíricas da conduta humana. Dentro desta concepção, a ética constitui uma ciência natural como a física, a química ou a biologia. Este ponto de vista colide, entretanto, com o que existe de mais característico no fato moral que é o sentimento do dever.
É ilusória, portanto, a pretensão de se construir uma "moral científica", baseada exclusivamente na observação dos fatos e prescindindo de qualquer fundamento metafísico. Dos fatos jamais se poderá tirar as noções de autoridade e de obrigação, sem as quais a moral é inconcebível. É por isso que Boutroux dizia que "qualquer moral científica está condenada a não ser moral ou a deixar de ser científica... A razão é simples: a ciência verifica, não nos prescreve nada; a moral, pelo contrário, não se contenta em observar, obriga". E, pelo mesmo motivo, Poincaré acentuava que "não há ciência imoral, como não pode haver moral puramente científica. A ciência limita-se verificar o que é; dá-nos indicativo, quando muito, optativos mas nunca imperativos".

7. Importância da ética — Alguns filósofos consideram a ciência moral como "condição suficiente da virtude". É o caso de Sócrates e Platão que admitiram a maldade como resultado da ignorância. Não basta, porém, conhecer o dever para cumpri-lo, é necessário ainda o esforço da vontade para subordinar a conduta ao mesmo. Outros filósofos, como Rousseau, concluíram pela inutilidade prática da moral como ciência, na convicção de que bastam "a consciência e as nossas inclinações" para conduzir nossos atos ao caminho do bem.
Sem duvida, nosso senso moral inato nos pode levar a praticar boas ações. Mas é inegável que o conhecimento das normas do dever facilita o seu cumprimento. A ciência moral mostra com clareza, os princípios que devem orientar nossa conduta e justifica, racionalmente, o dever que devemos cumprir, evitando que nossa ação seja dominada pelas reações instintivas, pelos impulsos da afetividade e pelos sofismas da paixão.
Além disso, a moral é um complemento indispensável a todas as outras ciências. O progresso da inteligência e da cultura seria supérfluo e até prejudicial, se não concorrei para melhorar o homem e encaminhá-lo à prática do bem. A ciência só contribui para o engrandecimento do indivíduo e da sociedade, quando ao serviço dos valores morais. Por isso dizia Sócrates, com razão, "quem sabe se todas as ciências, sem a ciência do bem, não seriam mais nocivas do que úteis".

Agora assista o vídeo e faça um relatório




EXERCÍCIOS
1. Esclarecer a definição da ética.
2. Explicar o método do estudo da ética.
3. Estabelecer as condições psicológicas da vida moral.
4. Dividir a ética em suas partes fundamentais.
5. Justificar o caráter cientifico da ética.
6. Realçar a importância e a significação da ética na vida do individuo e da sociedade.

SEGUNDO ANO AULA 9 - MORAL


Moral Geral

I. NOÇÃO DE DEVER.

I. Definição. — Dever é a obrigação moral de praticar ou de não praticar uma ação. É uma necessidade, imposta pela lei moral, de realizar o bem. O conhecimento da existência do dever nos é fornecido pela observação psicológica e pela consciência moral. Esta consciência nos mostra que nossas ações podem ser boas ou más, havendo, por conseguinte, além do interesse e da inclinação, um terceiro motivo que nos faz agir - o dever.

2. A consciência moral. — É a capacidade que possui o homem de distinguir o bem do mal. Não se confunde com a consciência psicológica que é, a intuição que um ser tem das modificações que nele se processam. A consciência psicológica é simples testemunha das nossas ações, ao passo que a consciência moral é juiz das nossas ações e das alheias.
Para os empiristas (Hume, Stuart Mill, Spencer, Dürkheim), a consciência moral é simples hábito mental, resultado do costume, da educação, do meio social, ou da legislação humana. Tudo indica, entretanto, que a faculdade de distinguir o bem e o mal não constitui simples produto da experiência. Representa, ao contrário, uma capacidade inerente à natureza racional do homem. É a própria razão "ordenando os atos da nossa vida".

3. Valor da consciência moral. — Para certos filósofos, a consciência moral é clarividente infalível. A ciência moral perde, neste caso, toda utilidade prática, uma vez que a consciência não precisa de orientação, nem de controle. Este ponto de vista é, porém, exagerado e falso, uma vez que a experiência nos mostra, em muitos casos, a falibilidade da consciência c n influência deformadora que sobre a mesma exercem o hábito, a profissão, a paixão, etc.
Os céticos incidem no erro oposto, ao considerar a consciência moral como simples convenção, como mera instituição arbitrária e artificial dos homens, conservada pelo costume. Seu argumento básico é que se a distinção entre o bem e o mal fosse uma lei natural, a consciência seria invariável no tempo e no espaço. Ora, dizem eles, entre os povos selvagens não há consciência, nem moralidade, e, entre os civilizados os costumes sofrem incessantes transformações.
Ao contrário, porém, do que afirmam os céticos, em parte o homem tem a noção do bem e do mal, do direito e do dever. "As variações da consciência moral resultam, não da falta de princípios morais, mas da aplicação defeituosa destes, motivadas exclusivamente pela influência das causas exteriores, umas sociais, como o grau de civilização, as tradições, as condições de vida, etc., e, outras, pessoais, como as paixões, os preconceitos, etc.".

4. Caracteres do dever. — Segundo o testemunho da consciência, o dever apresenta os seguintes caracteres:
a) O dever é obrigatório. — A consciência nos atesta que somos obrigados a observar a lei moral, embora conservemos, em virtude da nossa liberdade, o poder físico de cumpri-la.
b) O dever é absoluto. — A consciência revela que o cumprimento do dever é incondicional, acarretando, por isso, uma obrigação absoluta. O interesse e o prazer têm a suas leis e as suas regras, mas são condicionais e relativos. Só o dever é incondicional e absoluto, constituindo, como dizia Kant, um imperativo categórico.
c) O dever é universal. — A obrigação imposta pelo dever se estende a todos os homens, no tempo e no espaço. A moralidade representa uma relação da natureza humana com o seu fim e, "como todos os homens têm a mesma natureza e o mesmo fim, segue-se necessariamente, que todos estão sujeitos à mesma lei".

II. NATUREZA DO DEVER.

5. Matéria do dever. — O dever, como vimos, é a obrigação de praticar o bem. A matéria do dever é constituída pelo bem moral em si ou objetivo. Este bem é, na hierarquia dos valores, o bem absoluto e último. Segundo Lahrs, o bem último do homem consiste "na tendência para o seu fim último pelo desenvolvimento harmonioso e máximo de todo o ser, que se efetua sob o império da razão pela subordinação das inclinações inferiores às faculdades mais nobres, para o bem de todos os homens, estreitamente unidos entre si pela justiça e pelo amor".

6. Forma do dever. — A forma do dever é a obrigação, através da qual o bem moral em si "se impõe à nossa vontade exigindo o seu cumprimento". A obrigação, ao contrário do que afirmam certos filósofos, não se baseia na sanção, pois já que supõe a obrigação: o castigo ou a recompensa só se aplica a alguém que tenha cumprido ou violado um dever. Do mesmo modo é errôneo o ponto de vista dos que admitem, como Kant, que a obrigação se fundamenta na razão, uma vez que esta demonstra, mas não obriga: a razão pode nos impor uma necessidade de pensamento, isto é, uma evidência, não uma necessidade de ação. Não podemos também concordar com a opinião de Descartes e Puffendorf quando afirmam que a obrigação se baseia num decreto obrigatório de Deus, pois sabemos que Deus como ser infinitamente sábio não age sem motivo e sem razão.
Ao contrário dessas concepções falsas, devemos reconhecer que a obrigação de realizar o bem moral deriva da vontade dr Deus, autor dos princípios supremos que regulam as relações morais. Na realidade, o dever fundamenta-se, não só na natureza humana, como na vontade divina. A natureza humana "idealizada pela razão fornece a matéria que é o bem, e u vontade divina dá-lhe a forma obrigatória que faz dele mu dever propriamente dito".

7. O bem moral formal. — O bem moral em si, princípio e matéria do dever, nada mais representa, como vimos, do que a perfeição absoluta da nossa natureza, concebida pela razão. A concepção desse ideal supõe um conhecimento exato da natureza e das leis e fins do universo. Nessas condições, como poderá esse ideal ficar ao alcance da compreensão de todos os homens? Esta dificuldade é resolvida pela teoria do bem moral formal.
O bem moral formal consiste na subordinação da nossa vontade ao bem em si, na medida em que as circunstancias nos permitem conhecê-lo. Por isso, podemos defini-lo como “uma vontade conforme ao dever consoante é conhecido”. Sob esse aspecto, o valor moral das nossas ações depende, portanto, da intenção com que as mesmas são praticadas. Desde que a intenção seja boa e vise o cumprimento do dever, os atos por ela inspirados também serão bons. "Eis como, diz Lahrs, a Providência pôs a perfeição moral ao alcance de todos, fazendo-a depender imediatamente, não da instrução ou do desenvolvimento intelectual de que muitos são incapazes, mas da boa vontade e pureza de intenção que estão ao alcance de todos. Na realidade, o homem é moralmente grande, não pelo que faz, mas pelo que deseja".

III. CONSEQUÊNCIAS DO DEVER

8. A responsabilidade. — É a obrigação que tem todo ser livre de responder pelos seus atos e sofrer as conseqüências acarretadas pelos mesmos. A responsabilidade supõe a imputabilidade; a primeira noção aplica-se ao agente e a segunda ao próprio ato: os atos de que somos responsáveis não são imputáveis.
Distinguem-se duas espécies de responsabilidade:
a) Responsabilidade moral. — É a responsabilidade pela qual o homem responde pelos seus atos diante da própria consciência. Esta responsabilidade incide sobre todos os atos morais, interiores ou exteriores, públicos ou privados, e até sobre
as simples intenções.
b) Responsabilidade social. — É a responsabilidade pela qual o homem responde pelos seus atos perante as autoridades sociais, por infrações às leis civis. A responsabilidade civil apenas se refere aos atos exteriores, uma vez que a intimidade das consciências só é conhecida por Deus. Existe ainda uma outra espécie de responsabilidade social, resultante da influência, boa ou má, que exercemos ao nosso redor pelos nossos atos.
O livre arbítrio e a consciência da obrigação constituem fundamentos da responsabilidade moral.

9. O mérito e o demérito. — O mérito é "o aumento de valor moral ou de perfeição, que o indivíduo adquire pelo fato de se conformar com o dever". O demérito é, pelo contrário, “a diminuição de dignidade e de valor moral, resultante da pratica do mal".
O valor do mérito de um ato moral depende: a) da importância do dever cumprido; b) das dificuldades vencidas ou dos sacrifícios realizados; c) da elevação e pureza das intenções.

10. A virtude e o vício. — A virtude é o hábito do bem, isto é, o hábito de agir em conformidade com o dever. À virtude se opõe o vício que é o hábito do mal, ou uma disposição permanente a agir em desacordo com o dever. Segundo Sócrates, são quatro as virtudes principais ou cardeais: a prudência, a coragem, a temperança e a justiça.
São as seguintes as condições da virtude: a) o conhecimento: para se praticar o bem é necessário conhecê-lo; b) o amor: não basta conhecer o bem, é preciso ainda ama-lo c) o esforço voluntário: a conquista do bem é fruto de uma vitória sobre as inclinações, os instintos ou as paixões.
À luz desses caracteres, podemos dizer que a virtude é o hábito de cumprir o dever com inteligência, amor e energia.
11. A sanção. — É o conjunto de recompensas e castigos conseqüentes à observância ou violação da lei natural. Os atos virtuosos são dignos de recompensa, assim como os atos viciosos são passíveis de castigo. A recompensa distingue-se do favor e do benefício que são bens gratuitos e do salário que é a remuneração de um trabalho, que se dá em virtude de uma combinação prévia e recíproca.
As sanções se dividem em: a) Sanções temporais, baseadas na vida presente, isto é, na existência terrena. São de quatro espécies: 1) Sanção legal, resultante das penas impostas pela sociedade aos transgressores de suas leis; 2) Sanção social, resultante da estima que a opinião pública concede à virtude, ou do desprezo que vota ao vício; 3) Sanção pessoal, resultante da satisfação (alegria, tranqüilidade) ou desagrado (tristeza, remorso) da nossa consciência; 4) Sanção natural, resultante das conseqüências boas ou más, acarretadas pelo exercício perfeito ou imperfeito dos nossos órgãos, funções e faculdades, b) Sanção eterna, baseada na vida futura, isto é na existência supra-terrena.
As sanções temporais, consideradas em conjunto ou separadamente, revelam-se insuficientes. A sanção legal é sujeita a erros freqüentes e só atinge os atos exteriores, sem dar valor às intenções. A sanção social não vai além dos atos externos e não pune todos os crimes; a opinião pública é injusta, instável e caprichosa. A sanção pessoal ou da consciência é mais exigente nas almas escrupulosas do que nos corações empedernidos. A sanção natural só alcança as ações físicas e orgânicas e, em certos casos, pune os inocentes, como nos defeitos e doenças hereditários.
A justiça exige que o bem seja recompensado e o mal punido. As sanções temporais são imperfeitas e insuficientes, a sanção da vida futura, a sanção divina, pode ser integralmente justa, perfeita e universal. A lei moral exige, por conseguinte, o concurso de Deus. Somente Ele, em sua infinita perfeição, pode satisfazer nossa sede de justiça absoluta.

Exercícios
1. Elucidar a definição de dever.
2. Explicar a natureza da consciência moral.
3. Mostrar o valor da consciência moral.
4. Assinalar os caracteres do dever.
5. Esclarecer qual a matéria do dever.
6. Dizer em que consiste a forma do dever.
7. Explicar a teoria do bem moral formal.
8. Elucidar a noção de responsabilidade.
9. Distinguir mérito e demérito.
10. Definir e classificar as sanções.